COMUNICADO Nota de Pesar: Julia Zomer Continue Lendo
11/04/2017
Medo a represálias ainda é o principal fator para que não seja feita a denúncia. Policiais em período probatório são maiores vítimas
Todo tipo de assédio, seja moral ou sexual, deve ser combatido de maneira ostensiva. A regra vale para todas as áreas, independente da profissão. Na Polícia Judiciária Civil não deve ser diferente. Nesta entrevista, o presidente do Sindicato dos Escrivães de Polícia Judiciária Civil, Davi Nogueira, faz o alerta sobre as práticas abusivas sofridas por alguns policiais, que por medo a represálias, preferem ficar no anonimato. Questiona que há relatos de que alguns delegados se aproveitam do cargo para assediar membros da equipe. Confira:
Existe
assédio moral na Polícia Civil?
O ideal é que não houvesse, mas infelizmente ainda
existe.
Quem pratica esse assedio e quem são as vítimas?
Os autores do assédio são alguns delegados. Como
presidente do sindicato dos escrivães, falo do assédio moral sofrido pelos
escrivães, mas não duvido que ocorra também com os investigadores de polícia e
inclusive entre delegados.
Porque
ocorre o assédio moral na Policia Civil?
Talvez
pela insegurança, despreparo para exercer a função, sentimento de inferioridade
por parte de alguns delegados. Não sei ao certo, creio que somente um psicólogo
poderia explicar os casos individualizados, porém, quando a análise é feita
coletivamente, em nível de instituição, podemos destacar algumas causas:
imaginem uma pessoa, com pouca ou nenhuma experiência de trabalho, que dedicou
sua vida a estudar e passar num bom concurso e de uma hora para outra
passa a ser responsável em dar ordens que podem por em risco a sua vida e a de
seus colegas de trabalho. Nesse caso, o autoritarismo disfarça a sua
insegurança.
Acontece
que para ser delegado de polícia é necessário somente passar em concurso
público. Não exige, por exemplo, o conhecimento de como gerenciar e
liderar equipes. Assim, temos visto ???concurseiros???, sem perfil para polícia,
atraídos pelo salário, ingressando na profissão.
Ser delegado é ter a responsabilidade de já no primeiro dia de
trabalho, ter que comandar equipes, que muitas vezes, possuem
décadas de experiência na função policial.
A
exigência do curso de Direito é adequada para o exercício de um cargo jurídico,
porém o Direito não capacita ninguém para exercer a função de líder e gerente.
Contudo, essas duas características também são necessárias ao delegado, pois é
ele quem vai liderar a equipe de policiais e gerenciar a delegacia.
A
proposta do ingresso único na carreira, em tramitação no Congresso Nacional,
visa, entre outras coisas, corrigir essa distorção. O policial só exercerá cargo
de chefia quando provar que sabe ser chefe!
Como
um delegado poderia ter um sentimento de inferioridade perante um escrivão ou
um investigador?
Uma coisa é você ser autoridade por direito, outra é
ser de fato.
Não é raro encontrar escrivão com maior espírito de
liderança e aptidão para gerenciar do que um delegado, afinal, a nós não é
exigido formação exclusiva na área de direito.
Temos escrivães formados nas áreas jurídicas e
administrativas, entre outras.
Esse
é um problema generalizado na Policia Civil?
Não!
Felizmente é a minoria de delegados que tem esse comportamento. Em sua maioria,
a Polícia Civil é composta de delegados competentes e bons líderes e
que não precisam assediar moralmente ninguém para demonstrar que são
autoridades.
A maior
parte de delegados dá orgulho à instituição e são respeitados por suas equipes.
?? um prazer para qualquer escrivão trabalhar com esses delegados que respeitam
os profissionais que compõem a Polícia Civil.
O
problema é causado por uns poucos, porém, o estrago provocado reflete em toda
instituição, pois o policial assediado, não raro, passa a ter problemas de
saúde e nesses casos é comum o afastamento das funções por recomendações
médicas.
Como
ocorre o assédio moral nas delegacias?
Normalmente o assédio ocorre quando o delegado,
exercendo seu poder de autoridade, determina que o escrivão cumpra atribuições
que são restritas aos delegados.
Raramente a vítima, testemunhas ou suspeitos são
ouvidos por um delegado e essa é uma atribuição restrita a eles.
Vá ao presidio e peça aos presos para levantar a mão
quem foi interrogado na delegacia por um delegado, não haverá surpresa se somente
os criminosos de colarinho branco levantarem a mão.
A carreira dos delegados de polícia está seriamente
ameaçada de extinção, existem diversas PECs no congresso com esse objetivo e
infelizmente, alguns delegados preferem agir de forma a reforçar a percepção de
sua dispensabilidade.
Porque
os escrivães não denunciam o assédio?
Medo.
Como já dito, a maioria das vítimas são policiais em estágio probatório. E, há
uma pressão psicológica para que esses aceitem o que é
determinado, do contrário, podem sofrer represálias.
Quais
as consequências?
Um dos
grandes receios dos escrivães é o de ser removido para uma delegacia
distante de seus familiares.
Esse
tipo de ameaça costuma se concretizar na pratica no caso de o escrivão não
aceite o assédio moral?
Dificilmente! Para um delegado remover um escrivão de
uma delegacia para outra, há a necessidade de justificar ao delegado regional e
posteriormente ao conselho superior de polícia, sem falar que para remover um
policial de uma delegacia, há a necessidade de se providenciar outro para
ocupar seu lugar e essa dinâmica nem sempre é fácil de se conseguir, porém os
escrivães que estão no estágio probatório, preferem não arriscar e com isso
sofrem calados.
Qual
a solução para o problema?
Respeito! Todos nós somos policiais, todos somos
concursados e cada um tem sua atribuição bem definida, basta cada profissional cumprir
sua obrigação para que tudo se encaminhe bem. O respeito não é obtido através
da imposição, do medo. Nenhum profissional autoritário é digno do cargo que
ocupa.
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